Discussão sobre conveniência da mudança na geografia local leva em conta argumentos como Belo Monte e até a morte de Dorothy Stang.
Os paraenses estão divididos. E, a depender do lado (ou lados) que vencer a queda de braço, a cisão será definitiva – e geográfica. Tramitam na Câmara dos Deputados dois projetos do Senado que abrem a possibilidade para a criação de dois novos Estados a partir da divisão do Pará, hoje a segunda maior unidade da federação, com 1,2 milhão de quilômetros quadrados. As novas unidades já têm nomes e endereços. Ao sul nasceria o Estado de Carajás, com 285 mil quilômetros quadrados de área rica em minério e gado. A oeste, o Estado de Tapajós, com 722 mil quilômetros quadrados repletos de rios e territórios ainda preservados.
Foto: Arte/iG
Se proposta for aprovada, o Pará vai ser o menor dos três Estados que vão surgir da sua divisão
Marabá e Santarém são hoje as principais cidades das regiões, respectivamente, e poderiam ser alçadas ao título de capitais dos novos entes federativos. Pelo desenho, Tapajós, a área mais extensa, teria 230 mil habitantes e Carajás, 1,6 milhão. O restante do Estado ficaria com 4 milhões de habitantes.
A discussão sobre a conveniência da mudança na geografia da região leva em conta argumentos que vão desde a instalação da usina de Belo Monte na região de Tapajós, um dos principais projetos energéticos do mundo, até a morte da missionária Dorothy Stang – assassinada, segundo defensores do projeto, pela ausência do poder público na Amazônia. Se aprovada, a proposta será votada em plebiscito a ser organizado e fiscalizado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Pará. A expectativa, porém, é que o plebiscito, se aprovado, seja realizado apenas no ano que vem – o projeto ainda tem que voltar para o Senado. A consulta seria realizada nos municípios que poderão integrar as novas unidades. Caberá à Assembleia Legislativa paraense discutir os impactos administrativos, financeiros, econômicos e sociais da divisão territorial.
Já a divisão de opiniões foi exposta em recente debate promovido pela Câmara entre dois deputados paraenses: Zenaldo Coutinho (PSDB), crítico da proposta, e Giovanni Queiroz (PDT), um dos maiores entusiastas da separação.
Além dos custos com o aparato burocrático, com a criação de estruturas de governo, tribunais de conta, de Justiça, Assembleias Legislativas e representações federais – ao menos seis novos senadores e 16 deputados representariam os novos Estados em Brasília –, Coutinho diz temer que as regiões, isoladas, sofram um processo de empobrecimento. Ele diz não ser possível comparar a situação no Pará com a de Estados desmembrados nos últimos 30 anos, como Mato Grosso do Sul e Mato Grosso e Goiás e Tocantins, este mais recente. No caso de Tapajós, diz, a área possui enormes áreas florestais e indígenas de conservação integral. Por isso, o modelo aplicado no Tocantins, área de cerrado, sem restrições ambientais para o chamado corte raso e que se transformou em fronteira agrícola e pecuária no Brasil, não se aplica ao novo possível território.
“Minha preocupação é com a dificuldade do PIB da região do Tapajós, que hoje é de 10% do Estado. Isso vai ter efeito na educação, na saúde, na segurança pública. Corremos risco de empobrecimento da região”, defendeu, durante o debate promovido pela Câmara.
Em relação a Carajás, uma das áreas mais ricas em minério de ferro do planeta, o deputado tucano lembra que das 20 milhões de cabeças de gado em todo Estado, 14 milhões ficam na futura Carajás, “uma região rica, mas um Estado pequeno, menor do que a Vale [mineradora que atua na região]”. Ou seja: a riqueza deixaria de ser distribuída entre os outros municípios, conforme o argumento Ele lembra também que, mesmo com a riqueza gerada pelo sul do Estado, áreas do norte, como Marajó, apresentam um dos piores IDHs do País.
Já Queiroz afirma que não existe hoje na Amazônia um projeto de desenvolvimento para a região maior do que a divisão geopolítica. Para ele, não há risco de empobrecimento de Estados isolados. Para sustentar a opinião, lembra que o mesmo era dito de Mato Grosso, quando deu origem a Mato Grosso do Sul, há 30 anos, e de Goiás, de onde surgiu o Tocantins. Afirmou, durante o mesmo debate, que atualmente os “Estados-irmãos” cresceram mais do que a média nacional e hoje têm índices semelhantes de desenvolvimento. No Tapajós, por exemplo, cita áreas de produção de cacau e de peixes que podem alavancar a economia local, diferentemente do que ocorre hoje.
“Vamos deixar quem quer independência [decidir]. São 1,3 milhão de pessoas numa área de rio amazonas piscoso, que produz e ajuda a abastecer a região, inclusive Manaus. Belo Monte [que ficaria no Tapajós] é extremamente importante para o Brasil e vai desenvolver muito a região. Temos uma fronteira agrícola Cuiabá-Santarém formidável, migrando para aquela região”, afirma.
Além dos parlamentares, a proposta de divisão do atual Pará em três Estados é debatida em comitês na internet, que abriga o “Movimento pelo Plebiscito do Novo Estado Sustentável”, que quer Tapajós, e o “Comitê Carajás”. Este último, inclusive, divulga os nomes dos diretores do comitê, que já elegeu os “inimigos” da proposta, entre eles o deputado Zenaldo e a Ex-governadora Ana Julia Carepa (PT-PA).
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